Informativo Eleitoral 11/2020

Desincompatibilização de Servidor Público e apresentação de programa de rádio e TV por pré-candidato

A iminente possibilidade de adiamento das eleições municipais de 2020 em função dos efeitos da pandemia do “novo coronavírus” vem causando uma série de dúvidas acerca do cumprimento dos prazos e datas do Calendário Eleitoral, instituído pela Resolução/TSE nº 23.606. Nesse contexto, tornou-se frequente o questionamento sobre o prazo a ser cumprido pelos servidores públicos que pretendem se candidatar aos cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador, em atendimento às regras de desincompatibilização para as próximas eleições municipais.

Outra frequente dúvida, também relacionada ao exercício profissional, é sobre a proibição destinada às emissoras de rádio e televisão de transmitir programa apresentado ou comentado por pré-candidato a partir do dia 30 de junho do ano da eleição, cujo descumprimento pode implicar na imposição da multa e cancelamento do registro da candidatura do beneficiário.

Assim, diante das frequentes dúvidas relacionadas a esses temas, atualmente potencializadas pela possibilidade de alteração da data de realização das eleições municipais, na medida em que afetam diretamente o exercício profissional dos pré-candidatos que necessitam interromper suas atividades para se adequarem às regras do pleito, a equipe do escritório Vieira Barbosa & Carneiro – Advogados divulga o presente Informativo com orientações sobre as regras gerais de desincompatibilização de servidores públicos e apresentação de programa de rádio e televisão por pré-candidato no ano da eleição.

Para demais informações, entre em contato através dos nossos canais. Confira:

DESINCOMPATIBILIZAÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO

(Prazo alterado pela EC 107/2020 ➜ até 15 de agosto de 2020)

Apenas para contextualizar os conceitos já abordados no Informativo Eleitoral nº 04/2020, observa-se que a doutrina conceitua elegibilidade como sendo “o direito público subjetivo atribuído ao cidadão de disputar cargos público-eletivos”[1], também tratada pelo Supremo Tribunal Federal como a “adequação do indivíduo ao regime jurídico – constitucional e legal complementar – do processo eleitoral”[2].

Assim, é imprescindível a qualquer pleiteante a cargo eletivo, inclusive aqueles que pretendem a reeleição, atentar-se às regras constitucionais e legais que permitem ao pretenso candidato exercer a chamada “capacidade eleitoral passiva”, ou seja, a possibilidade de ser votado. E, para isso, o candidato deve se adequar às condições de elegibilidade, e não incidir em nenhuma causa de inelegibilidade.

Nesse cenário é de se chamar atenção para a incompatibilidade, que nada mais é do que o impedimento decorrente do exercício de cargo, emprego ou função pública. Assim, a desincompatibilização é o mecanismo pelo qual o cidadão se desvincula do cargo do qual é titular, no prazo previsto em lei, para assim tornar possível a sua candidatura.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, o fundamento dos institutos da incompatibilidade e da desincompatibilização “reside na tentativa de coibir – ou, ao menos, amainar – que os pretensos candidatos valham-se da máquina administrativa em benefício próprio, circunstância que, simultaneamente, macularia os princípios da Administração Pública e vulneraria a igualdade de chances entre os players da competição eleitoral, bem como a higidez das eleições”[3].

A Lei Complementar nº 64/90, no seu art. 1º, II a VII, define os prazos de desincompatibilização tendo sempre como referência o dia da eleição, de acordo com cada cargo eletivo ao qual se pretende concorrer, relacionando as hipóteses dos cargos ou funções eventualmente ocupadas pelos pretensos candidatos.

E, a teor do art. 1º, II, “l”, da Lei Complementar nº 64/90, para concorrer aos cargos de vereador, prefeito e vice-prefeito, deve o servidor público – sem funções de chefia ou direção – se desincompatibilizar do cargo no prazo 3 (três) meses anteriores à eleição.

Referida regra se destina aos servidores públicos “estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da administração direta ou indireta da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e dos territórios, inclusive das fundações mantidas pelo poder público”.

Para os fins dessa norma, deve-se entender por servidor público as pessoas físicas que prestam serviço ao Estado, com ele mantendo vínculo laboral e remunerado, que podem ser enquadrados nas seguintes categorias[4]:

  • Servidores estatutários ou funcionários públicos: sujeitam-se ao regime jurídico estatutário e ocupam cargo público;
  • Empregados públicos: submetem-se ao regime da legislação trabalhista (CLT) e ocupam emprego público; e
  • Servidores temporários: são contratados por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, submetendo-se a regime jurídico especial por exercerem função sem vinculação a cargo ou emprego.

Observações:

Servidores efetivos: afastamento temporário com garantia ao direito de percepção dos vencimentos integrais[5];

Servidores comissionados (demissíveis ad nutum)[6] e temporários[7]: afastamento definitivo (exoneração);

➜ A comunicação feita à direção da unidade em que o servidor exerce suas funções pode ser suficiente como prova de desincompatibilização[8];

➜ Quando a data-limite de desincompatibilização ocorrer em dia não útil, o pedido de afastamento poderá ser realizado no primeiro dia útil subsequente[9].

➜ Servidores do Poder Legislativo[10] que pretendem se candidatar também devem se adequar às regras de desincompatibilização[11].

 

PROIBIÇÃO DE TRANSMISSÃO DE PROGRAMA DE RÁDIO OU TV APRESENTADO OU COMENTADO POR PRÉ-CANDIDATO

(Prazo alterado pela EC 107/2020 à até 11 de agosto de 2020)

É importante esclarecer que aqueles que exercem as profissões de radialista, apresentador, comunicador, comentador, locutor, repórter, etc, não estão obrigados a se desincompatibilizar dessas funções para concorrerem a cargos públicos.

Porém, a Lei nº 9.504/97, em seu art. 45, § 1º, prevê a proibição às emissoras de rádio e televisão, a partir de 30 de junho do ano da eleição, de “transmitir programa apresentado ou comentado por pré-candidato”.

E, na hipótese de o pré-candidato ter apresentado ou comentado programa após a referida data, e posteriormente ser escolhido em convenção partidária, infringindo-se, portanto, a regra do art. 45, § 1º, da Lei nº 9.504/97:

➜ sujeita a emissora responsável pela transmissão a pena de multa[12]; e

➜ pode implicar no indeferimento ou cancelamento do registro da candidatura do beneficiário, além de se sujeitar à averiguação de abuso de poder econômico por utilização indevida de veículo ou meio de comunicação social.

 

A referida restrição, destinada primordialmente aos veículos de comunicação, segundo a doutrina, pretende “privilegiar os princípios da imparcialidade e da impessoalidade na prestação de serviço público, bem como da isonomia e do equilíbrio entre os participantes do certame, impedindo-se que uns sejam beneficiados em detrimento de outros. Tendo em vista que o rádio e a televisão constituem serviços públicos cuja realização pelo particular depende de concessão do Poder Público, há mister que o concessionário aja com imparcialidade perante os candidatos e as agremiações participantes do certame”[13].


[1] GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 137.

[2] STF – ADC 29, Rel.  Min. Luiz Fux. Publicação: 29/06/2012.

[3] TSE – RO nº 26465, Rel. Min. Luiz Fux, Publicação em 01/10/2014.

[4] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20ª edição, Atlas, 2006, p. 502.

[5] Lei nº 8.112/90, Art. 86.  O servidor terá direito a licença, sem remuneração, durante o período que mediar entre a sua escolha em convenção partidária, como candidato a cargo eletivo, e a véspera do registro de sua candidatura perante a Justiça Eleitoral. […] § 2º . A partir do registro da candidatura e até o décimo dia seguinte ao da eleição, o servidor fará jus à licença, assegurados os vencimentos do cargo efetivo, somente pelo período de três meses.

[6] TSE, Súmula 54: A desincompatibilização de servidor público que possui cargo em comissão é de três meses antes do pleito e pressupõe a exoneração do cargo comissionado, e não apenas seu afastamento de fato.

[7] “Pessoa contratada para atender necessidade temporária de excepcional interesse público deverá se afastar três meses antes do pleito” (TSE – RESPE nº 72793, Rel. Min. Luciana Lóssio, Publicação:  23/09/2014).

[8] TSE – Acórdão de 25.11.2010, no Ag-RO nº 132527.

[9] TSE – Acórdãos de 3.9.2014, no RO nº 71414; de 8.5.2014, no AgR-REspe nº 9595 e, de 25.11.2010, no AgR-RO nº 161574.

[10] “[…] a pessoa que ocupa cargo de direção no Poder Legislativo Estadual, com atribuição de ordenamento de despesas, ante a ausência de norma específica, é regida pela regra geral do art. 1º, II, l, da Lei Complementar nº 64/90. Portanto, deverá se desincompatibilizar em até 3 meses antes do pleito para concorrer aos cargos de Prefeito ou Vice-Prefeito” (TSE – Consulta nº 45971, Rel. Min. Luiz Fux, Publicação: 19/05/2016).

[11] O TSE entende que, para concorrer ao cargo de deputado federal, o candidato que exerça cargo em comissão na Câmara dos Deputados deverá se desincompatibilizar da função pública nos três meses anteriores ao pleito, nos termos do art. 1º, inciso II, alínea l, da Lei Complementar nº 64/1990 (TSE – AgR no RO nº 0600763-96, Rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, julgado em 24/10/2019).

[12] Resolução/TSE nº 23.610, Art. 43, § 3º Sem prejuízo do disposto no parágrafo único do art. 75 desta Resolução, a inobservância do estabelecido neste artigo sujeita a emissora ao pagamento de multa no valor de R$ 21.282,00 (vinte e um mil, duzentos e oitenta e dois reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais), duplicada em caso de reincidência.

[13] GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 453.

REFERÊNCIAS

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanela. Direito administrativo, 20ª edição, Atlas, 2006.

GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4737.htm > Acesso em 21 mai. 2020.

______. Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990. Estabelece, de acordo com o art. 14, § 9º da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, prazos de cessação, e determina outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp64.htm > Acesso em 21 mai. 2020.

______. Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8112cons.htm > Acesso em 21 mai. 2020.

______. Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm > Acesso em 21 mai. 2020.

______. Supremo Tribunal Federal. Disponível em < http://portal.stf.jus.br/ > Acesso em 21 mai. 2020.

______. Tribunal Superior Eleitoral. Disponível em < http://www.tse.jus.br/ > Acesso em 21 mai. 2020.

VIEIRA BARBOSA & CARNEIRO – ADVOGADOS
Departamento de Direito Eleitoral

LUIZ FABRICIO BETIN CARNEIRO
Advogado sócio e fundador

FERNANDO BUENO DE CASTRO
Advogado associado

ALESSANDRA MUGGIATI MANFREDINI SILVA
Advogada associada

RENAN RIBEIRO
Advogado colaborador